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Opinião
Florbela Estevão – Arqueóloga e Museóloga
Florbela Estevão
Arqueóloga e Museóloga

Paisagens e Patrimónios

O Castelo de Pirescouxe

6 de fevereiro de 2023
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O Castelo de Pirescouxe é indubitavelmente um edifício de grande valor histórico-patrimonial e já foi tema de uma das crónicas deste jornal. Mas, evidentemente, nenhuma crónica esgota o tema que pretende abordar, pelo contrário, cada uma delas tem como propósito chamar a atenção para aspetos do nosso património, procurando criar nos nossos leitores a motivação em conhecer mais. Assim, para todos aqueles interessados na história deste solar e da família Castelo Branco recomendo vivamente a visita à exposição “O Morgadio do Castelo. Memórias, identidade e ordenamento de um território (apontamentos)”. Esta está acessível na Galeria Municipal do Castelo de Pirescouxe até ao de 11 de fevereiro.
Com efeito, esta exposição é um bom exemplo de um proveitoso trabalho de colaboração entre a Associação de Defesa do Património Ambiental e Cultural de Santa Iria de Azóia (ADPAC) e a Câmara Municipal de Loures, trabalho de equipa que também integrou o contributo de investigadores de disciplinas distintas como João Borges (Estudos Urbanos – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas - Nova – ISCTE) e João Vieira Caldas (História da Arquitetura Portuguesa – Instituto Superior Técnico). A exposição em causa assinala os 580 anos da instituição dos morgadio dos Castelo Branco, “O Novo”, aportando novos conhecimentos sobre esta família, o solar e as estratégias de ampliação da propriedade, mas não só, é também um momento que visa promover uma reflexão critica sobre a ocupação e gestão do território.
O morgadio dos Castelo Branco foi criado em 31 de outubro de 1442, por Nuno Vaz de Castelo Branco e sua esposa, Joana Juzarte, o que significou que esta família escolheu esta propriedade, esta quintã, como se designava nessa época, como a propriedade mais importante da casa dos Castelo Branco. A instituição de um morgadio era uma forma jurídica de proteger e simultaneamente de organizar a propriedade de um grupo familiar, os bens fundiários de uma família, de uma linhagem, assegurando a sua posse durante muitas gerações.
Este tipo de vínculo significava que o filho varão mais velho era o único que podia herdar o vínculo, garantindo deste modo a impossibilidade da divisão dos bens por outros membros da família. A propriedade, o morgadio permaneceria como uma unidade ao longo das várias gerações. Cabia ao fundador do vínculo definir o perfil do herdeiro e qual procurava desde logo firmar um apelido com prestígio, escolher um brasão familiar e construir um solar de acordo com o estatuto social da sua casa ou linhagem.
Ora, esta quintã tinha sido propriedade do primeiro marido de Joana Zuzarte, Diogo Afonso Alvernás e era designada por Pero Escouche. A quinta passa a ser de Joana Zuzarte por morte do seu primeiro marido e posterior falecimento da filha de ambos, Inês Dias. Assim, Joana Zuzarte tomou posse desta quintã após partilhas realizadas em 1425, altura em que já era casada Nuno Vasques, com quem tinha contraído matrimónio em 1421.
Será então o segundo marido de Joana Zuzarte, Nuno Vasques, que em meados do século XV e no seguimento da instituição do referido morgadio irá edificar um paço de acordo com o seu estatuto social. A construção de um castelo altaneiro em modo reduzido revela ainda uma conceção imbuída no universo medieval. Todavia, este paço ou solar passou a ser um forte marco na paisagem, estabelecendo uma clara hierarquia relativamente ao território envolvente.
A estratégia dos herdeiros das gerações seguintes, desde os finais do século XV até aos meados do século XVII foi sempre o de ampliar a propriedade, agregando outras, conseguindo mesmo prolongar a mesma até à margem do rio Tejo e obter com isso os rentáveis salgados. A exposição apresenta documentos que atestam a aquisição da Quinta das Duas Portas, em 1539, por Dona Margarida, mulher de D. Pedro de Castelo Branco (II); assim como a compra de um olival e casas junto à Quinta Castelo-Branco em 1594, por Pedro Castelo Branco (III). Um dos aspetos mais notáveis foi o terem conseguido a exploração das salinas, nomeadamente com a construção de marinhas em terras salgadas do rei, exploração de os reis procuravam controlar para si dada a importância económica do o sal para a época em questão.
Esta crónica não pode apontar todos os aspetos interessantes que esta exposição divulga, importa mesmo visitá-la para melhor conhecer a história deste conjunto e a sua ligação ao território. Existe uma monografia em formato digital no website da Câmara Municipal de Loures no separador Cultura/Lazer e Museu/ Galerias, ou seja, disponível neste link https://indd.adobe.com/view/2b2dbd99-5be0-48b2-bf9c-9ea7de3f2416
Termino a crónica transcrevendo as palavras de Cristina Mendes, presidente da direção da Associação de Defesa do Património Ambiental e Cultural de Santa Iria de Azóia: “O projeto, inicialmente centrado na história do morgadio e no trabalho de investigação anteriormente desenvolvido, ganhou vida própria e demos por nós a escrever, ou melhor, a questionar e a abrir uma reflexão sobre o futuro deste monumento e do território em que se insere. (…) falar de Património é muito mais do que falar do passado. É, sobretudo, falar do futuro e da qualidade de vida (e até da sobrevivência!) das pessoas e comunidades. Esperamos que todos os que visitem esta exposição desfrutem tanto da chegada, como nós da jornada!”.

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