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Opinião
Alexandra Bordalo – Advogada
Alexandra Bordalo
Advogada

Das Notícias e do Direito

O Maior Acompanhado, in memoriam das Tias

6 de junho de 2022
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Se para muitos a maioridade significa conquista e independência, alcançadas com direitos antes não permitidos, como o voto e a carta de condução, muitas vezes a par da entrada na universidade e toda uma nova vida.
Para outros, não!
O regime do maior acompanhado, constante da Lei 49/2018, consiste no modelo de protecção e acompanhamento para aqueles que não podem ou não conseguem, sem apoio, tratar dos assuntos relacionados com a sua vida.
São todos aqueles que por razões de saúde, deficiência ou fruto do seu comportamento (por exemplo, alcoolismo, toxicodependência, que também são doenças reconhecidas e declaradas pela Organização Mundial de Saúde), não podem, ou não conseguem tomar decisões, por isso, precisando de apoio.
As medidas de acompanhamento, distintas de pessoa para pessoa, são decretadas pelo tribunal e destinam-se a proteger a pessoa, obstando a que outros tomem decisões que lhe sejam prejudiciais ou fiquem à mercê da vontade abusiva de terceiros.
Note-se que, cada vez mais as doenças do foro neurológico e psiquiátrico são constatadas, como o Alzheimer, a demência, escleroses diversas, mantendo as pessoas com saúde física e longevidade substancial, ainda que incapacitadas.
Por outro lado, muitos que nasceram, ou que em virtude de acidentes ou doenças, sempre foram dependentes, são uma fonte de preocupação para os seus cuidadores, em regra os Pais, preocupados com o que lhes irá suceder após a partida daqueles.
Ainda, tantos que sofrem acidentes, ou são acometidos de doença súbita, ficam em coma ou incapacitados por tempo indeterminado, muitas vezes até à morte
Este regime, ao estabelecer medidas de acompanhamento especificas para cada pessoa, respeita e considera que uma pessoa pode, por exemplo, ter um problema de saúde ou de deficiência que a impede de tratar de assuntos mais complicados, ou irá impedir no futuro, mas é perfeitamente capaz de cuidar do seu dia-a-dia, ou de continuar a votar ou conduzir.
Assim, mesmo que se sofra de doença muito incapacitante, a sua vontade não tem de ser integralmente substituída pela de outra pessoa.
Esta é a razão pela qual o tribunal, depois de analisar cada caso concreto, decide os actos que podem e não podem ser praticados pela pessoa.
O novo regime do maior acompanhado impõe que a pessoa é sempre ouvida pelo juiz que também determina a realização de um exame médico, assim se concretizando nos autos a condição que afecta a pessoa, as consequências e os meios de apoio e de tratamento adequados. Note-se que, sendo necessário o próprio juiz fará a deslocação onde a pessoa se encontrar, hospital, cuidados continuados ou paliativos, confirmando pessoalmente o estado do acompanhado.
Quando munido de toda a informação, médica e social, o tribunal profere decisão na qual nomeia o acompanhante e discrimina os atos que o acompanhado pode, ou não, livremente realizar.
Assim, fica claro se a pessoa pode votar, casar, comprar, vender, fazer testamentos, ir ao casino, etc.
Isto é particularmente importante, porquanto a vida bem nos ensina e demonstra, que ao virar de cada esquina jaz um oportunista ou espertalhão, e quando se sente o cheiro do dinheiro ou do património, muitos são os familiares e amigos que surgem.
Porém, os Acompanhantes, aqueles que o Tribunal determina que têm tal encargo têm uma multiplicidade de deveres e obrigações.
Primeiro que tudo, zelar e garantir o bem-estar e a recuperação, se possível, do acompanhado. Por esta razão, o acompanhante deve manter contacto e visitar a pessoa que acompanha, pois só assim pode aferir se lhe estão a ser proporcionados os cuidos e qualidade de vida a que tem indubitável direito.
A principal missão do Acompanhante será a de ajudar o acompanhado nas situações em que o tribunal determinou que é necessário, nuns casos mais, noutros menos.
Pensemos no Pai que requer o acompanhamento do filho, nascido com uma qualquer diminuição que impediu a sua autonomização, cuja função é assegurar-se que o filho, agora maior acompanhado, tem todas as suas necessidades satisfeitas, como até então.
Ou diferentemente o Acompanhante, a quem foi cometida a administração de parte ou da totalidade do património, o recebimento e cobrança de valores, o pagamento a funcionários e outros. Pensemos naqueles que têm património bastante que demanda actos de gestão efectiva.
Por outro lado, actos de alienação, venda do património do Acompanhado ou decisões extraordinárias quanto à sua saúde, por exemplo internamento em instituição, dependem de autorização prévia do tribunal.
Tem, ainda, o Acompanhante obrigações de prestação de contas, demonstrar o que gastou, onde e porquê, não podendo confundir patrimónios e contas.
O Acompanhante pode ser substituído e a sentença que determina o acompanhamento é dinâmica, porque pode ser revista em qualquer momento, e obrigatoriamente a cada cinco anos.
Desejamos que assim os nossos Maiores, sejam também maiores na fase mais débil da sua vida, e acompanhados com plenitude sob vigilância do tribunal que assegure a sua dignidade e integridade do seu património.
Que sejam Maiores, acompanhados e livres de interesseirões como alguns que conheci.
Almejemos.

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