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Das Notícias e do Direito

Da Ética dos bons costumes ao critério da escolha

6 de maio de 2019
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Ouve-se regular e comummente dizer que à Mulher de César, não basta ser há que parecer.

O quê? Perguntam muitos.

SÉRIA, sim, não basta ser séria, há que parecer séria…

E de um brocardo de essências e aparências que remonta há dois mil anos e muitas civilizações atrás, deparamo-nos em pleno Século XXI com questões éticas nas empresas, na causa pública e nas múltiplas atividades profissionais.

Assim, discute-se e debate-se a contratação de familiares para lugares de confiança (uns sim, outros nem tanto) no Governo, nas autarquias e a acuidade de tal escolha.

Podemos sempre declarar o óbvio, as pessoas da maior confiança pessoal e profissional são as mais próximas.

Em tese geral isto é verdade. Agora será sensato? Decerto que não.

Aliás, basta atentar em muitas entidades e verificar os laços familiares para tornar inevitável o sorriso e comentários, quanto às largas capacidades e competências numa só família e sua entrega à coisa pública, pois não os vemos a prosseguir tais carreiras no privado!

Se por um lado somos uma república, seria de pensar que já teriam caído em desuso estas sucessões dinásticas nos cargos, nos lugares.

Se olharmos para o setor privado vemos que grandes grupos empresariais têm absolutamente profissionalizada a gestão e administração. Sim, e há elementos da família que lá trabalham em postos importantes, mas a formação e preparação dos mesmos é indiscutível.

Porém, não é possível declarar o mesmo a propósito dos múltiplos familiares empregados nas mesmas entidades públicas, e de como os concursos de recrutamento têm fotografia, pois são feitos para integrar quem já está e não para contratar o melhor!

Enfim, conhecemos também outras ideologias de recrutamento de familiares, sistemático e abundante, de tal forma que num grupo de empresas de dimensão multinacional era difícil encontrar um trabalhador sem laços a outro, pois encontravam-se pais e filhos, irmãos e cunhados, sogros e noras, enfim uma autêntica promiscuidade. E deliberada, pois era um grupo privado, que assim melhor controlava ímpetos de descontentamento e greves, visto que inexistiria um trabalhador afetado, mas inúmeros familiares da mesmíssima família!

Deparamo-nos assim com conceitos de ética na escolha, seriedade e transparência.

Daí que não baste sê-lo, há que parecê-lo!

Ponderar estes temas conduz-nos também a pensar nos conflitos de interesses e nos debates sobre incompatibilidades.

Ainda que se seja capaz de ser isento, sério e imparcial no exercício de determinada função ou execução de ato, não é próprio ou adequado que o faça, face a este conflito ou dependência de quem tem interesse diverso.

Pois, a mera possibilidade de sobre si recair a suspeição já é motivo bastante para que essa pessoa não assuma tal cargo.

Esta última questão está há muito resolvida em países como os EUA em que os congressistas e senadores declaram os seus interesses (em regra as áreas de negócio que apoiaram a sua eleição), e assim conhecem-se à partida os seus interesses e limites éticos.

Numa altura em que tanto se debate a transparência, mostra-se óbvio, patente e manifesto que todos estão sob escrutínio, daí que a inteligência e bom senso sejam absolutamente imprescindíveis para o momento de se proceder a qualquer escolha para indigitação pública.

A bandeira da confiança pessoal tem, inevitavelmente, de ser arriada perante o superior critério ético.

Ainda que esta pessoa seja da maior confiança e capacidade profissional, não pode ser escolhida se isso puser em causa a imagem de seriedade e honradez de quem a escolhe.

Ou se trabalhou em dada área ou empresa aí representando e defendendo tais interesses, não faz sentido que agora ocupe lugar de redação legislativa sobre esse setor ou de escolha entre empresas.

Se o caminho se faz caminhando, não deve ser difícil evitar determinadas encruzilhadas e escolhos, pois a ética na escolha e no aceitar desempenhar qualquer função assim o impõem.

Daí que seja necessário pôr por escrito e implementar códigos de conduta, que declarem o óbvio, para afastar tentações.

Como se disse, não basta ser, em tempo de aparências e striptease nas redes sociais, há, também, que o parecer.

Alexandra Bordalo Gonçalves - Advogada

Rui Rego - Advogado

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