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Opinião
Florbela Estevão – Arqueóloga e Museóloga
Florbela Estevão
Arqueóloga e Museóloga

Paisagens e Patrimónios

Eduardo Gageiro uma figura maior do fotojornalismo

7 de abril de 2024
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Neste mês de abril em que se celebram os 50 anos da democracia no nosso país gostaria de salientar a obra de um excecional artista, Eduardo Gageiro, fotografo que tão bem captou com a sua lente, com o seu “olhar” esse extraordinário dia de 24 de Abril de 1974! Evoco a icónica imagem de sua autoria, que todos nós conhecemos, aquela em que um soldado retira o retrato do ditador da parede do gabinete de Silva Pais, diretor da DGS, ex-Pide (Polícia Internacional e de Defesa do Estado), organismo responsável pela repressão de todas as formas de oposição ao regime político do Estado Novo.
Eduardo Gageiro é uma figura maior da fotografia e do fotojornalismo português, com uma longa carreira profissional. A sua obra testemunha a evolução social e histórica de Portugal ao retratar o modo de vida dos portugueses, assim como algumas personalidades do país desde a década de 50 do século XX até aos dias de hoje, 2024. Recomendo vivamente a exposição Factum patente no Torreão Nascente da Cordoaria Nacional que se encontra aberta ao público até ao dia 5 de maio, de entrada gratuita e onde podemos apreciar a maior exposição até agora organizada sobre Eduardo Gageiro.
A qualidade da obra fotográfica de Eduardo Gageiro tem sido amplamente reconhecida como atestam os numerosos prémios que tem alcançado tanto a nível nacional como no estrangeiro. Não vou aqui nomear todos eles, até porque a lista é muito extensa, apenas recordo o prémio do World Press Photo em 1974; ou a Medalha de Ouro, em 2005, no Salão Internacional de Fotografia no Japão; ou ainda as duas Medalhas de Ouro, igualmente em 2005, na Exposição Internacional de Fotografia Artística na China, apenas para mencionar alguns.
Como é do conhecimento geral Eduardo Gageiro nasceu em Sacavém a 16 de fevereiro de 1935 e desde muito cedo conviveu, ainda criança, com os trabalhadores da Fábrica de Loiça de Sacavém, pois muitos deles frequentavam a Casa de Pasto do pai. Começou a sua atividade profissional muito jovem, justamente como empregado de escritório na dita fábrica, cargo que desempenhou entre 1947 e 1957. Durante esse período conviveu com os artistas que trabalhavam para a fábrica, e terá sido também nessa época que desenvolveu o seu interesse pela fotografia.
Um artista particularmente importante nesta fase da vida de Gageiro terá sido o escultor Armando Mesquita, pois foi ele que lhe “deu aulas de composição”, como enquadrar os vários objetos/temas no campo da objetiva fotográfica. Aliás, terá sido ele que incentivou o pai de Gageiro a comprar-lhe a sua primeira máquina, uma Rolleicord. Até então, Gageiro usava uma máquina do seu irmão, uma Koday Baby e outras máquinas emprestadas o que limitava a qualidade das suas fotografias. Ainda nessa época concorreu a alguns concursos de fotografia tendo angariado vários prémios o que muito o estimulou.
O seu interesse pela fotografia levou-o a abandonar o seu emprego na fábrica e a tentar a sua sorte como fotojornalista, começando no Diário Ilustrado. Não foi um período fácil, na época era muito difícil a um jovem desconhecido conseguir penetrar no círculo dos fotógrafos associados à cobertura jornalista. Todavia, conseguiu ficar com o Suplemento Literário deste periódico. Quando o Diário Ilustrado fechou passou a colaborar na publicação Eva e também no Almanaque. Neste último fez parte de uma equipa muito aliciante que muito contribuiu para progredir na sua autoformação. Aliás, a coordenação da equipa de redatores cabia ao escritor José Cardoso Pires, e terá sido aqui que os seus trabalhos passam a revelar um maior domínio do enquadramento fotográfico. O seu primeiro livro saiu em 1971 intitulado Gente, obra quase subversiva que na época representou uma autêntica “pedrada no charco”, verdadeiros rostos de gente de um tempo e de um lugar num país pobre e cinzento.
A sua carreira como fotografo e fotojornalista foi longa. Como já mencionei começou pelo Diário Ilustrado, seguiu-se Eva, Almanaque, Match Magazine; foi também editor da revista Sábado, Associated Press (Portugal), Companhia Nacional de Bailado, Assembleia da República e da Presidência da República. Também colaborou com a Deustche Gramophone, Yamaha e Cartier. Atualmente é free lancer e prepara mais um livro.
Muitas foram as obras de grande qualidade que publicou, entre elas o acervo sobre as Fotografias de Abril. Com uma carreira tão notável recebeu inúmeros prémios e distinções, apenas vou referir algumas: Cavaleiro da ordem de Leopoldo II – Bélgica, Comendador da Ordem do Infante D. Henrique, Mestre Fotógrafo Honorário da Associação de Fotógrafos Profissionais.
A obra de Eduardo Gageiro é algo que nos interpela e emociona. As suas fotografias são obras de arte e simultaneamente testemunhos, documentos de tempos e lugares povoados por pessoas. Mais do que acrescentar palavras a esta modesta crónica recomendo aos nossos leitores a visita à exposição Factum!

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